Em Portugal, é normal que quem trabalha nas chamadas “indústrias criativas” não seja considerado um trabalhador de pleno direito. Se há clientes para satisfazer, a lei é posta de lado. Entre outros abusos, são comuns as “borlas”, os salários baixos , os “falsos recibos verdes”, o desrespeito pelos horários ou os atrasos nos pagamentos. Nestas áreas, há demasiado espaço para ideias que permitem a uns aproveitarem-se do trabalho de outros.
Esta semana, a agência The Hotel abriu candidaturas para um inovador, e ilegal, programa de estágios, ao qual chamam “The Hostel”. Procuram oito jovens, divididos em dois turnos, para trabalhar durante quatro meses sem salário. De acordo com o jornal Dinheiro Vivo, os primeiros quatro escolhidos vão desenvolver ideias que a empresa irá (tentar) vender à Sumol+Compal*. O segundo «lote de jovens criativos» irá trabalhar para outro cliente.
Quanto às possibilidades de continuidade no final do “estágio”, a resposta é dada no anúncio: «Findos os 4 meses, para além da experiência e da aprendizagem, há sempre a hipótese de, assim o trabalho o justifique, subires para o piso de cima e integrares a equipa da The Hotel. Mas isso já será outra conversa».
O assunto é ainda mais grave quando esta ladainha é difundida por um órgão de comunicação social, sem qualquer referência à ilegalidade do recrutamento. Ao fazê-lo, o Dinheiro Vivo torna-se cúmplice do abuso e mostra como se troca a deontologia jornalística por publicidade encapotada e sem escrúpulos.
Estágios de quatro meses sem remuneração são ilegais, sejam individuais ou “ao lote”.
*Será que a Sumol+Compal também não vai pagar pelas ideias à agência The Hotel? Vamos contactar a empresa para tentar esclarecer a questão.